terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Histórias

Se eu falhar na tarefa de te divertir

Alguém de outro tempo,
de um lugar qualquer.

Pra investigar vestígios
de pequenos feitos
que se dissipam,

registrar seus acasos
como um olho alheio
reprisa passos.

I

Tão tarde
e cada vez mais longe
mas eu ainda lembro
tão tarde
que a vida era festa
de tarde
de corações fechados
tão tarde
e só posso dizer
não tarde
que já era tão tarde.

Não esperar da noite.
Ela que não vem mais
me recusou seu não
e ofereceu ausência
talvez como resposta.

Continuo por quê?
Tento me dissolver
na diversão de todos.
Continuo pra quê?

Era tarde demais
a noite deslizava
pro indeterminado.
Outra vez, um refém.
Olhos que seguem vozes
que anunciam caos,
mas um caos atraente,
um espaço aberto
a qualquer acaso.
Eu disse qualquer coisa.

Ninguém nunca sabe como acontece.

II

A necessidade sugere
vontades estreitas.

As árvores entardecendo,
sol domado em gotas

Longas conversas sobre nada,
silêncios de aproximação.

Mas nos olhos fechados
a imagem de uma ausência.

Idílio descascado
uma camada fina
que à unha revela
uma inscrição antiga.

E os receios dela.

Eu não sou tão fácil.
Eu ri um fogo frio.
Ela deita sobre mim,
seduzido por uma sombra.

III

Não vou me sujeitar
a razão nenhuma.

Sou destino de quem foge
ou se perdeu
e sabe que vai me ter
enquanto quiser
e sabe que o início
é a prévia do fim.

Sombra que lenta se alonga
Com os olhos de vontade
do sol, que se curvam lentos.   
Afiada e consciente.

Compreensão é cicatriz.
Suaves soam
delicadezas perecíveis
Suaves voam.

As flores no caminho
do incompleto suicídio.

IV

As últimas expectativas
se desvestem amarrotadas
derramadas no chão do quarto.

Se misturam espumas de sentidos
envolvem nossas vias invisíveis
a inundação seus olhos profundos
a respiração do mar que me afoga
arrebentação fonte de ondas quentes
boiando na corrente do cansaço
ela parece um horizonte limpo

ela parece tudo.

V

Largado
na tempestade sólida
que me ofusca em seco
os olhos furados.

Jogado
no furacão do abismo
nas costas do nada
na cama de chão.

Aqueles olhos
não mais
pra mim.

VI

Papéis amassados em branco
correntes de ecos cruéis
a vida em seu próprio inferno,
um labirinto conhecido.

Dias curtos no tempo que não passa.

Assim compartilho
imobilidade
solidão em festas,
incapacidade de me diluir
silêncios desconfortáveis.

Noites longas no tempo que não pousa.

VII

Que dia é hoje?
— Olha, sua ex.
Hoje é todos os dias já passados.
— Vejo sempre esses seus antigos casos.
Só o presente faz do passado escolha.
— Acho que é o novo namorado.
É preciso
— Mas sei lá
reconhecer o possível
— cê tá de boa com tudo?   
e viver extremos.
— Bom demais, então.
Fósseis que se escavam em ruínas de amores.
— Aquela outra é que era muito gostosa.

VIII

Obituário
do que não foi

Leve
como um fantasma
memória
de um ato imutável

Leve
como quem vive
ainda
diante dos mortos.

IX

A indiferença forçada,
a mágoa, a aceitação
morna dos amores móveis.

A reconstrução humilde
depois das guerras perdidas.

Esforço de entendimento,
acolhida do eu passado,
tardia libertação.

E tudo parece um vento
nos cabelos de outra história
contada por não sei quem.

Sobre o registro do tempo
sobram possibilidades
mudas que talvez não brotem
mas mesmo que as esperanças
se revelem ilusões
elas ainda impulsionam
o movimento dos olhos.

Talvez virá outro dia
pra arriscar outros rabiscos
sem nada de impressionante.

Tanto faz